2.10.2024

 a língua de ferro

da meia noite

já contou doze

2.06.2024

 vi voar

6.18.2017

são tempos de outono 
no sudeste do país,
aqui, entretanto
na largueza de dentro 
- entressafra -
jaz,
intermitente,
armas em punho, alabardas em brasa,
à veia cava
meu inverno dantesco
amazônico

4.25.2017

Não sei se existe,
mas que insiste, insiste

-Aninha
olha!
isso aqui existe...
o que estaria acontecendo nessa quarta? já pedi pra calares a boca e retrucas, isso por que te pedi antes de que falasses justamente por isso: para que não fales. mas falo. te tornas a voz do brasil desse jeito. recuso a ouvir te ouvindo recusar a calar-te. penso no que aconteceria: se ela cantasse, essa voz? ouviríamos ou mudaríamos a estação? aqui não há estações definidas, bem sabes...o calor dos trópicos não se dá esses caprichos. encho a boca de uvas passas e mastigo ruidosamente enquanto tento corrigir alguns erros do passado presente, idos e vindos...em vão.

12.16.2016

O Lysoform dissolvido em água não perde sua potência corrosiva e inflamatória, por isso indica-se no rótulo do produto a utilização de luvas de borracha (sem especificação de cor), máscaras cirúrgicas e óculos de acrílico. Quando misturado ao solvente aquoso, o Lysoform tende a se dissolver mantendo as propriedades abrasivas fundamentais à remoção da sujeira incrustada em piso de taco.
Dona Marina não usa luvas, nem máscaras, nem óculos, mas o restante faz corretamente: põe uma tampa do produto em meio balde de água umedecendo levemente o pano de chão com o preparado. Depois o esfrega sobre o piso em recortes geométricos recobrindo todos os cômodos com uma fina camada de limpeza e aroma cítrico. Há uma mancha, entretanto, que não sai de forma alguma. Dona Marina insiste, esfrega, seca, esfrega novamente e de novo, sem o rodo, com a mão mesmo, até arder a palma, até esfolar os calos, até sumirem as pontas dos dedos pretos deletados pela soda cáustica. A mancha não sai. A mancha não sai nunca. Pode usar aquele outro produto mais forte, pode passar tinta, pode arrancar o taco, a mancha não sai. Pode implodir a casa, pode matar a patroa, pode calar o cachorro, a mancha não sai. Pode ter fuga, pode ter alforria, pode ter camburão, navio, cota, bolsa, a mancha não sai. A mancha não sai e é amarga e tem um gosto agridoce sangüíneo e textura de vidro e arde toda vez que Dona Marina pensa no filho morto.