8.01.2013

Reflexões a Montmartre

Ao calcular as medidas dos desenhos encaixados de certos paralelepípedos, eu percebo sombras e anjos incorrigíveis e árvores tortas, mortas desde a tenra semente.

Sinto deus que dispõe entre minhas carnes e o sol sua velha lente de aumento.

E além do bem e do mal,
meu pensamento é de você
Bares
Madrugadas

Suadouros

Abram suas garrafas que eu nunca me curo a seco.
Imagino colares sobre o seu pescoço desnudo mirado em um espelho de uma casa que vamos habitar.
Quando você vier
Quando vier de inteireza
E pouca reza
Quando quiser me querer
Quando souber que longe de mim você é arquitetura frágil
Longe de mim você não presta.

E quando você vier
Eu também estarei a chegar
Quando você vier já não serei mais
esta criatura que espera idosa
o amor da doida juventude

remoçarei e linda cantarei um beijo ao pé do ouvido dos teus pés cansados.


6.30.2013

Não com derrota progredir
mas deveria responder às bombas sem soluços
estes implantes polvorosos que nos lançam
vitórias para deturpar o peito que povoamos
calados
taquicárdicos
fingiremos sonhar felizes
fingiremos crer agora e amanhã...

O título
terra ao chão seca
os diplomas que almejamos
pra tapar o burado dos dentes
fortuito conhecimento
e esses fogos no céu da boca
aftas dadivosas
oba-obas disfarçados
limões e cachaças
cruzando a noite de todos
travestindo os dias dos santos

os merengues se bailando
no calhambeque da saudade
pra amanhã carregar mundos
todos
com lajotas adorná-los
argamassa e giz e picolé
serão!,
me chamavas pra um modo de não viver aqui
manchando meus distintivos
as manchetes matinais
onde glutões
e mesas fartas
explodem tão cheirosos
nem sabem que não é alegria

6.10.2013

Em casa de Avoela -
ela cantarola
- ela louva 
o almoço têm vida
 e não falta morte 
próxima 
corte de bifes
 já lavo
- ei-a-me: gela-deira (facil,mente)
- e limpo-ei-a-me: fronte de nossa casa -

entendo, faz poucas horas seculares, de onde irradia 

-- posto que meramente real/estória este cosmo, 

[palpável nebulosa varrível, infinit08/finit03] -- 

minha dubiedade e atravancos no varrer de tododiamém
isso tudo, lúcida y soriente obrigação, 
para escancarados, tomarmos café preto proibido pela geriatria, 
silencio de cumplices, 
aceitar-que há-çucar imerso, 
cheio copo e tapioca naufragando, 
e mais sempre uma frutinha, 
ou sentimento comprimido de todos os comprimentos; 

vai o dia ao sentarmos e dividirmos a mesa e ouvirmos a tv-sin v: 'pode comer, meu filho', dito isto, ela também se autoriza. 
acariciaeralha cicarelli, que nos olha qual men-di-g(u)ar-di/e-an-t(e)ónten do bento seu lar:  bichos são como nossos bichos...e 3 seres dividem vida aumentando um a fé do outro:
 'precisa ser eterna', 
ousa, certeiro; 
'precisa proteção', intercede por mim; 
'jogarão migalinhas?' cica a-guarda: 
admirem...se... for mesmo a vida gangorra onde brincam, seriamente, vivas mortas ressucitadas autuadas estatuas deusas guerreiras, açaizeiras, aposentadas&pensionistas, concursadas, pastoras, professoras, atrizes, feministas, pássaras pregnantes, ovadas, caruanas, jornalistas, crianças, bonecas, travecas: 
o neto quero ser como elas, pronto:
semeada a verdade, ela sussurra uma oração, recebo...
tento acompanhar o momento onde não há abismo separando evangelhos de pontos. ritos? 
ex meros ex meios. 
ser já tão mulher todos os dias! saí e surge homem, sem ilusões, 
maravilhas cotidianas. 
'olha a chuva!' e vamos às cordas numa maratona de salvação, os 3. 
depois chega a visita: é belém! quanto tempo! tranca a cachorra! vamos almoçar e não poderei mais admitir, apavorado, a ciência do dia onde velhas, meninosmeninas e cadelas, juntos, uivando, dirão 'sim! a deus!'

6.05.2013

quando falou

- Esse pão é o meu corpo.


não ensinava a fé aos fiéis

posto que a fé não se ensina

ensinava

- isso sim é labor e suor -

 o engenho da metáfora.

Marquei um cafezinho com ela
Às quatro e meia do meio da tarde
Ali na alameda Helvétia com a Padre Eutíquio
Meus pés quando beijam a água do mar
Ficam eriçados
Meu coração bate no peito de um leão
Que gritaria que me dá esse cafezinho
Mas não vou aparecer
Chega de insônia.

6.04.2013

Almoço em Família

Estou a
Travar silêncios com o pudor
Preciso
Urgentemente
Lapidar a palavra à lixa
Para que ela me mostre seus
dentes

5.30.2013

Folhas

Há sempre folhas caindo no meu caminho
são amarelas são verdes
enquanto eu rumo a cidade
por baixo do sol que se esconde
dentro da caixa da história
o sol cravado no braço
o clima fantasma dos autos

aí vem a raiva e eu grito
me cozinha que sou carne assada
um pedaço de charque:
não é assim tão fácil que me esgoto
não é assim tão fácil que me corto
não é assim tão fácil que te esqueço
não é assim tão fácil que me engoles

Mas a folha,
sim,
As folhas que caem no meu lado
são um sinal pra jurar reverência
e não minto, estão comigo
amarelas e verdes
dependendo do vento, do lado, do olho

a folha que cai dá a paciência
são magos e bruxas que vivem nas copas
são águias e princesas que contam histórias
são gias avestruzes de outras alçadas
são João e Maria jogando pãezinhos

Outro dia uma folha caiu à minha frente
Aí parei
Desci do cavalo
Não quis acreditar mais no que o encanto me dava
peguei a folha
e repente
à mil metros do chão já estava

sentada à beira da cama
não vejo bem rindo/chorando
estava sentindo
era falta
se chorava, que doía
se ria, que lembrava

Estava por cima dela, sem nada poder
reações aqui misturam fluxos

passes por tudo
desejo
mas não por baixo da porta
um bilhete
suicida

5.21.2013

Céu Sujo

Concedo às nuvens o céu que criei
para alegrar-me
aos domingos
e em dias de funeral

(desses que são inteiramente feitos de ocaso)

Mas somente àquelas que
mereçam os
beijos lânguidos do vento

Cumulus Nimbus/ Nimbostratus /Cirrostratus


Nuvens que sejam dadas a dançar temporais

Nuvens que te façam parar e olhar para o alto

Nuvens que te convoquem (com discrição e elegância) a gostar de mim.

5.17.2013

LAUDO



constatou-se melancolia

(no raio-x o pulmão saiu empesteado de folhas secas)

5.09.2013



Esses reencontros fortuitamente oportunos
mesmo que não mais pelo entre lençóis
me dão um
cio
na memória


5.08.2013

saudades das aulas de mergulho

preciso
regressar

àqueles olhos verdes

5.07.2013

E toda melancolia do mar
foi a festa do que restava do povo
O mar chorou peixe.
O povo tinha fome.
O mar ou o povo
Não sei o que me dói mais.

5.03.2013

PERFORMANCE PARA MULHERES - elaborada por Raquel Morales

ferramentas:

1 arma de espoleta

execução:

ao andar pela rua, esperar ser abordada por algum homem, seja por um olhar mais invasivo ou até por palavras relacionadas ao desejo que ele tem pelo corpo feminino e suas intenções seuxais em relação ao mesmo. não deverá demorar muito para acontecer, visto que essa é uma situação diária na vida de 90% das mulheres.

quando o sujeito realizar sua ação, a mulher deve sacar sua arma de espoleta e atirar contra ele.

depois que o sujeito se refizer do susto dado pelo tiro à queima roupa (que provavelmente vai lhe atravessar subjetivamente as entranhas, causando-lhe vergonha e desamparo) deve-se falar o seguinte texto:

"é assim que eu me sinto toda vez que sou assediada."

5.01.2013

A BOLA DE FERRO (daquelas que eram usadas para derrubar as casas antes das grandes construtoras explorarem outras tecnologias de destruição) DA MEMÓRIA


E o tempo há de curar.

haverá
 

de fazer inclusive o poema
 

que fiz em teu nome
 

TORNAR-SE a ruína
 

de um edifício abandonado

adeus L abstrata

Quando  coloco a verdadeira L, a L de carne e osso, parida por sua mãe, egressa de cidadezinha do interior de São Paulo, ao lado da abstrata L, aquela que criei em meus desvarios, um relicário de pernas e cabelos, percebo ser mais interessante chorar pela segunda do que pela primeira.

Tirei essa noite para livrar-me da abstrata L que amei intensamente durante uma semana e meia. Temos uma semana e meia de mulher, portanto. Uma semana e meia de faxina. Uma semana e meia preenchida por todas as incivilidades trágicas que fizeram do meu coração um homem cego e ingênuo.

Primeiro aniquilo o encontro de mãos, quando trocamos sutis carícias em uma viagem de ônibus. Desfaço-me das mãos, todas. Através de uma máquina de triturar os impropérios do tato - como essas que esmigalham papéis de escritório. As minhas mãos e as dela. Escreverei com os pés daqui para adiante. Adiante. Adianto-me para o dia em que não me doerá essa flecha pontuda e salgada espezinhando minhas carnes - eu não sentirei mais dor, eu não serei mais eu, serei outra, serei velha, e terei me esquecido até do nome dela. L. Até o codinome dela será um endereço abandonado.

Deito fora as trocas de olhares fortuitos, segredáveis, em meio aos colegas de trabalho. Pinto as memórias de azul escuro, já não se pode destacar mais nada das imagens, somos apenas azul escuro e é tudo. O que resta é essa lambuza cor de mar denso, não se sabe mais quem é quem e quem está olhando para quem. Foram embora os olhares fortuitos em meio ao azul escuro. L é de um azul escuro abissal. A L abstrata... A L real tem a pele branca e se porta como uma menina, isto é, não tem nada de azul escuro.

Livro-me também das palavras doces trocadas em cartas curtas tecnologicamente portáteis. As confissões amorosas, o desejo confesso de estar junto.

(deus falou assim pra mim:

como você pôde acreditar em tudo aquilo SEM SEQUER DESCONFIAR DAQUELE GOSTO DE ADOÇANTE EM CADA BEIJO NÃO ACONTECIDO?!

deus não suporta quando pessoas inteligentes se metem a burras e fazem tolices.)

Não sobra nada do meu relicário de pernas e cabelos. Não sobram motivos para chorar. Mais uma vez arrumo e limpo minhas coisinhas de modo a deixar o espírito em ordem.

adeus L. Abstração minha, sem ânimo eu te escrevo essa última bagunça. Da tua partida cuido eu.

 Da L verdadeira, aquela que tem vaidosa adoração por ser chamada de princesa pelos meninos do bairro, aquela que sorri finos sorrisos de boneca para garantir favores, aquela que age pelas arestas da vida escondendo-se na retaguarda da guerra, a força do tempo pode cuidar. 


4.30.2013

ver o céu clarear bem cedo é o que mais me aproxima de mim.

o quarto ainda é escuro mas lá fora a luz começa a se adensar... essa é a concretude ideal para os fogos metafóricos do meu espírito inquieto: tudo há de amanhecer.

eu não dormi essa madrugada.
esse é o meu retrato.

quatro e meia, cinco da manhã.

não tenha medo
isso não são olheiras
são navios de guerra.

e é tudo novo, mais um dia - as coisas em minha casa se perguntam porque eu não adormeci
eu não adormeci
mas pelo menos morri de amor

eu sou o mesmo bicho de sempre
outro. 

4.04.2013

envelha ser fora


esse espelho que evitavas
por sem molduras, deformavas
evaporando
petalando no caminho
poroso já abatido:
há tanta feliz idade

3.15.2013

essa janela que me orienta a vista
essa porta que te faz adentrar em mim. 
céu:

teus olhos que são o mar
mas um mar em branco
um branco moça
quase véu
chafurdados na bíblia
confusos
no papel antídoto das rebeldias
pureza
mucosa
sandice estrábica
tu.

mas ainda assim, céu.

3.03.2013

e nos olhos de toda mulher
há de pintar
o coração de um jaguar

2.21.2013

eu queria dormir naquela folha
que pousou na sua testa
vento vento vento vem tomar
um ar comigo,
enquanto eu preparo a sua festa
no meu umbigo






1.30.2013

Cobrança

Meus ouvidos recebem cobras à vontade desde o tempo onde eu não rastejava. Quando elas chegavam - quando chegam ao tímpano é quase como se dançassem uma dança de dor no estreito canal auricular, mas não são parecidas com insuportáveis dores de ouvido. São piores: aéreas em seu rastejar. É a falta de motivos que difama as cobras si mesmas como oroboros. Dentro de si há uma promessa de cura.
Agora o sussurrado de tua língua melada em busca dos segredos dos outros caminhos dos outros que nunca vou contar pros outros, novamente. Quando as cobras chegam à memória, em uma tentativa cruel de suborno réptil, também são surpreendidas por minha falta de atenção:  sei olhar nos olhos quando inoculam-me veneno, mas poucos sabem o quão peçonha minha é colossal como a usina que cria todo o mau e lança-o de Marte à Terra. Guerras também são bem vindas quando quero lembrar. É necessário dez anos minimamente para que eu lembre de algo. O ciclo do tempo corroeu a sensação de que somos um por todos. Sofro com este próximo ninho cheio de ovos longínquos, chocados serão pela serpente eucuriosa de tua libido errática. Tomo um copo de veneno pra ver se passo da água ao vinho, do pão aos peixes, da cobra ao coração.

1.29.2013

Olhos ardentes

Pimentas nas órbitas


 
Diante do castelo
de cartas marcadas 
Serei um homem
e um rato


(roer a roupa do rei até despir o poder
de seu veludo barato.)

1.17.2013

Quando ela
sai do meu sonho
nada disso
faz sentido
algum
nenhum
travesseiro
pode me confortar...

1.15.2013

eu te desejo
por onde meus poros
costumavam exalar
sonhos