12.16.2016

O Lysoform dissolvido em água não perde sua potência corrosiva e inflamatória, por isso indica-se no rótulo do produto a utilização de luvas de borracha (sem especificação de cor), máscaras cirúrgicas e óculos de acrílico. Quando misturado ao solvente aquoso, o Lysoform tende a se dissolver mantendo as propriedades abrasivas fundamentais à remoção da sujeira incrustada em piso de taco.
Dona Marina não usa luvas, nem máscaras, nem óculos, mas o restante faz corretamente: põe uma tampa do produto em meio balde de água umedecendo levemente o pano de chão com o preparado. Depois o esfrega sobre o piso em recortes geométricos recobrindo todos os cômodos com uma fina camada de limpeza e aroma cítrico. Há uma mancha, entretanto, que não sai de forma alguma. Dona Marina insiste, esfrega, seca, esfrega novamente e de novo, sem o rodo, com a mão mesmo, até arder a palma, até esfolar os calos, até sumirem as pontas dos dedos pretos deletados pela soda cáustica. A mancha não sai. A mancha não sai nunca. Pode usar aquele outro produto mais forte, pode passar tinta, pode arrancar o taco, a mancha não sai. Pode implodir a casa, pode matar a patroa, pode calar o cachorro, a mancha não sai. Pode ter fuga, pode ter alforria, pode ter camburão, navio, cota, bolsa, a mancha não sai. A mancha não sai e é amarga e tem um gosto agridoce sangüíneo e textura de vidro e arde toda vez que Dona Marina pensa no filho morto.