7.30.2012

Restolho que não entrou no projeto e que eu não quis jogar fora...


O cenário cultural brasileiro, sobretudo no que diz respeito à literatura, é caracterizado historicamente como um ambiente profícuo e criativamente diferenciado; este fato provavelmente se dá, dentre muitos fatores, pela extensão física do país e por consequência pela diversidade cultural pulsante nas cores, nas músicas, nos sabores, nos termos cotidianos referentes a cada recorte regional do país e suas bases de colonização. Além disso, nas muitas regiões nacionais existem subcategorias culturais, nascentes outras de cultura, que se estabelecem a partir de estruturas diversas tais como condicionantes econômicas, geográficas, educacionais, políticas e etc. Portanto, além de participarem como elementos distintos entre si da constituição da cultura brasileira como uma totalidade, as cidades e microrregiões são também compostas por mosaicos culturais em diálogo político e social, seja pelas aproximações ou pelas diferenças...
A morte tinha a boca amarela.
Caminhava por meu quarto enquanto eu insone sobre a cama pensava nela.

Pensar na morte já é morrer um pouco. Pelo menos para mim que não penso especialmente naquela espécie de morte pessoal e intransferível... penso na morte dos meus, dos que já foram, dos que amo e existem agora unicamente no amor que sinto. E isto é morrer um pouco.

Morrer um pouco insone sobre o travesseiro, morrer desta morte de boca amarela.
Morrer sabendo que não posso durar muito neste estado visto que o amanhã é sempre segunda-feira e preciso acordar cedo com algum descanso no corpo.

Morrer me deixa suada e com dor nas pernas, como se eu houvera realizado uma extensa pernada. Então folgo os nós dos pensamentos, tiro-os da cabeça e coloco-os ao lado, junto aos meus outros sapatos.

Fecho os olhos e não enxergo mais nada, percebo apenas aquela criação da minha alma que é o mais profundo de mim.

Não tenho medo da morte, eu que morro todo o tempo pelos que já perdi, acabei por me acostumar com ela.

A morte tem a boca amarela, mas o meu rio é mais caudaloso.


7.26.2012

Evolucionismo

Gostava de andar sobre as próprias pernas... quando elas foram amputadas naquela escuridão de período em que amputavam-se as pernas da população indeliberadamente, sentiu profunda devoção por seus braços.
Mas aí vieram os anos 90 e os braços também foram extirpados.
Restou-lhe a cabeça. Ele pensou: na cabeça não vão mexer, não interessa a cabeça.

Mal sabia ele que os métodos de desmonte eram muito refinados por conta de um progresso tecnológico que invisível passou dando tapas nas caras de todos.

Uma furadeira highpolitic, na madrugada distante, adentrou seus ouvidos sonolentos e liquidificou os pensamentos...

De manhã já estava com aquela inédita e, a partir dali, perpétua sensação de melancolia intelectual que o impediu de sair e ver o sol, que o impediu de ler os poeminhas fatais de amor, que o impediu de ouvir aqueles velhos samba-canções do Lupcínio.

Mas lutaremos à sombra! - Como bradou o rei Leônidas.


(O coração escondido no peito ainda vibrava em festivas pulsações, mas mantenhamos esta informação entre parênteses... isto é, entre dois mistérios, feito um segredo).

7.24.2012

MUNDIADO

Cheio de mundo
Carrego nos olhos
Dois horizontes
Sossegados
Castelos bonitos
Eclipses
Luas perfeitas e triangulares
Tuas pernas no inverno
Invento adiante
Mais vinte e quatro horas no ponteiro
Para costurar
A noite no dia
Descanso nas brechas do meu encanto
E quando acordado
Sou apenas inteiro.

7.15.2012

Filha órfã


Eu dizia para meu pai,
Não sou filha de Benedito – que era o pai de meu pai...
Sou filha de Antonio...
Mas ele teimava em retrucar que seu pai fora um homem muito bom, que tratava bem todos os empregados, que nunca ficara em dívida com ninguém e que, portanto, não era condição temível ser filha de Benedito.
E eu começava a chorar umas lágrimas ardidas que pulsavam tanto quanto minha fúria de peito.
Meus ímpetos bélicos faziam-me repetir: não sou filha de Benedito, sou filha de Antonio...
Mas Antonio era tão inclinado a Benedito que acabei ficando órfã.

7.11.2012

o sol (como
lâmpadas e mais lâmpadas
atrás da tua cortina)

acende o dia
no formato
daquele velho
arco da promessa.

bom dia bom dia
pra você que me esqueceu.

7.10.2012

Quando eu te vejo assim de cabelo preso meio mal preso, oclinhos de aro grosso... um pouco resfriada - com aquele contínuo gesto de esfregar a mão no nariz para não espirrar, com aquele casaco verde musgo pau-pra-toda-obra, com aquela expressão de quem está tentando compreender um cálculo matemático, com aquela voz de quem acabou de tirar um cochilo no meio da tarde, com aqueles pensamentos fugidios que te afastam de mim imediatamente e pra sempre...

Quando eu te vejo assim, eu fico doido de amor.

Casórios

As pessoas mais interessantes e loucas que conheci acabaram se tornando maridos e esposas suavizados pelo cotidiano do casamento.
A vida a dois, de repente, tornou-se uma inspiração, uma aspiração, um objetivo a ser realizado e legitimado por assinaturas, cartórios e outros vinténs.

Eu me pergunto apenas quando foi que nós desacreditamos da solidão e
a abandonamos à própria sorte, como se de fato esta velha amiga

fosse
uma bruxa.


Acendemos os fósforos e os atiramos na fogueira da Santa Inquisição.
Nunca mais solidão. Adeus velha amiga...

Somos teus traidores preferidos...

Nunca mais solidão... compreenda... também vivemos nossos sacrificios...
Quem te negou teve o dedo anular enforcadinho por um fio de ouro.


eu erro a reza
meu bem
sem implorar
pelo perdão.

7.08.2012

Bebê,
bebê,
pra te esquecer
eu me enfrescalho toda
e vou putanhar.

e nem vem que não tem,

na política, por exemplo, é a mesma ladainha.


Ah, não!

Pra quê palavras...?


Malditos outros que já disseram por mim.



A presença dela na sala era de desarticular os pensamentos e os movimentos. Uma lufada de vento a escancarar as janelas e a bagunçar a casa.
A presença dela, silenciosa, emudecia todo o resto.

Antonio, trêmulo, homem de poucas palavras, acenou timidamente e depois inventou um compromisso qualquer para poder se retirar em fuga branda.

A presença dela o deixava em fúria, coisa esta que poucos conseguem suportar sentados nos sofás e cadeiras do mundo.

Porta afora, conseguiu respirar novamente.

E depois não conseguiu mais.

7.06.2012


hoje eu estou vermelha
de uma tonalidade
mais intensa que a cor do sangue
que a cor da praia
ou que a cor das tuas calças abaixadas. 

Sem dúvida
estou de um
vermelho floresta
depois do incêndio.


7.04.2012

Doce Juventude

Um sonho depois do outro, todos
dobrados e colocados sobre a cabeceira da cama

para mais tarde serem guardados dentro de gavetas,
para mais tarde poderem fazer jazz em outras freguesias.

sonhos pluriculturais,

embalados por cantigas de roda antiquadas e sem vestígios sonoros a não ser aqueles que se referem à memória e seus silêncios.

A cara à tapa no travesseiro.
Ele pensa nela.
Ela pensa nele.
Ele pensa nela.
E ela, por sua vez, sem querer, pensa em uma outra.

Essa outra, uma parente: prima bonita que chegou dos Estados Unidos e usa uns lenços sobre a cabeça no estilo Jack O.

- Mas me conta um pouco mais sobre essa sua experiência nos esteites.

Não importa o discurso, o que importa são os dentes. Que apareçam os dentes. Os dentes da prima, e entre eles imagina-se a língua e dentro da língua o gosto de outras tantas infinitas primas. 

Beberam tanto vinho que o estômago  ardeu em azia e queimação...


De resto, a juventude estava toda especial naquela noite, docinha docinha.


Aquelas coisas tortas

Aquelas coisas tortas
quando vêm
são tão certas
abertas
despertas,
isto é:
em sorriso


Aquelas coisas tortas
assim tanto e bem como as portas
desafiam os caminhos
de dentro e de fora.

Aquelas coisas tortas
outrora peças mortas
voltaram à vida
e por isso
agora eu aprendi
a cuidar bem delas.
E não as deixo tomar sereno,

somente banhos de sol
e tempestades.

7.03.2012

Última cantiga para Luiza

Para dilacerar meu peito
só mesmo
a tua flecha envenenada
a rasgar o vento
feito o teu sorriso vago
que muitas vezes enxerguei
denso e vasto
(mas só enxerguei pra mim.)

essa minha retina ilusionista
reserva-me ainda tantas cegueiras...

e esse platão que vive no meu pensamento
te fez, algum dia, um pouco mais bonita
do que as tantas outras fadas desinteressantes
a serpentear pelo céu.

Hoje já não faz mais nada:

não voas
e nem o vento.
Valsinha número 1 - de sonho

Estavas viva e eu te dava calcinhas de presente de dia das mães e uma camisa com estampa da Madonna.